“O DINHEIRO COMPRA ATÉ AMOR SINCERO”

"O PSOL, ao defender a organização ministerial do governo, fez questão de reiterar que votou pelo conteúdo da proposta, não em troca de cargos ou emendas. Não entramos em "toma lá dá cá", ressalta o deputado Chico Alencar em artigo

2 jun 2023, 20:29 Tempo de leitura: 1 minuto, 51 segundos
“O DINHEIRO COMPRA ATÉ AMOR SINCERO”


Por Chico Alencar (Deputado federal/PSOL-RJ)


Essa frase do escritor e teatrólogo Nelson Rodrigues (1912-1980) me veio à lembrança várias vezes, durante as 10 horas de negociação de bastidores entre deputados da cúpula da Câmara e o governo, na última quarta-feira, 1/6 (dia da votação da Medida Provisória da reestruturação dos ministérios do governo Lula).

Nós outros, a maioria dos parlamentares, esperávamos, sem informação. A imprensa especulava: “Lula ligou pra Lira”, “Lira exigiu isso e aquilo de Lula”; “o clima está tenso” etc.

Era crucial para o Executivo, por óbvio, aprovar sua estrutura de governo, definida por Medida Provisória desde janeiro. Inclusive com novos Ministérios importantes, como os dos Povos Indígenas e da Agricultura Familiar e Desenvolvimento Agrário.

Do lado do Legislativo, Lira vocalizava “uma insatisfação generalizada com a articulação política do governo”. Leia-se pagamento de emendas e entrega de cargos, inclusive ministeriais. Também de “escuta”, “carinho”. De preferência do próprio Lula. Saudades do “orçamento secreto”, quem sabe?

Votar em razão da proposta, por convicção, sem qualquer condicionante, é coisa rara no padrão da política brasileira em vigor. O método da “compensação” abafa o mérito do que se analisa.

Só uma Reforma Política pode alterar esse modelo da “governabilidade do amor remunerado”, como dizia o atento e agudo ex-deputado Nelson Trad (1930-2011).

Um dos pontos seria realizar eleições para o Legislativo DEPOIS das do Executivo, como acontece em muitos países. Para deixar o povo com total clareza para decidir dar ou não ao vencedor do Executivo (presidente da República, governador, prefeito) a maioria no Parlamento – sem que o governante precise fazer “coalizão” não programática, que logo vira colisão, quando não chantagem permanente.

O PSOL, ao defender a organização ministerial do governo, fez questão de reiterar que votou pelo conteúdo da proposta, não em troca de cargos ou emendas. Não entramos em “toma lá dá cá”!

À meia noite, saindo da sessão, brinquei com um jornalista: “não demos nenhuma despesa pro governo…”. E ele: “talvez só vocês!”.



Charge: Nani