Deputados do PSOL querem Grupo de Trabalho para rever a Lei 13.954/19, que privilegia alto escalão em detrimento de servidores de menor patente nas Forças Armadas

Glauber Braga (RJ) e Fernanda Melchionna (RS) reuniram especialistas e representantes de entidades de proteção aos direitos da categoria, que fizeram uma grande revisão do quadro de perdas e aprofundamento das desigualdades entre as carreiras

7 jun 2023, 16:57 Tempo de leitura: 5 minutos, 13 segundos
Deputados do PSOL querem Grupo de Trabalho para rever a Lei 13.954/19, que privilegia alto escalão em detrimento de servidores de menor patente nas Forças Armadas

Os efeitos da Lei nº 13.954/2019 – que privilegiou militares de altas patentes e deixou retirou ou alterou direitos dos “praças” – foram o assunto principal da audiência pública que os deputados do PSOL Glauber Braga (RJ) e Fernanda Melchionna (RS) promoveram nesta quarta-feira (07.06), na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara (CREDN). Eles foram os primeiros parlamentares da Câmara a tomar a dianteira no Parlamento em defesa de algumas camadas das Forças Armadas (FA), no que se refere aos efeitos da reforma previdenciária e proteção social dos militares. Ao final da audiência, ficou estipulado um prazo de dez dias para que o ministro da Defesa responda sobre a criação de um Grupo de Trabalho para tratar do assunto, sob pena de ele ser alvo de convocação.

A audiência, de que participaram vários especialistas e representantes de organizações de defesa de direito desses servidores, que expuseram muitos dados em vídeos e exposições detalhadas, serviu sobretudo para resgatar os compromissos que não foram cumpridos para com a categoria, que não só viu aumentar muito a desigualdade em relação à cúpula das FA como perdeu mesmo poder aquisitivo e benefícios. São estimados em cerca de 50 mil os servidores prejudicados.

Em dezembro de 2019, a nova lei entrou em vigor alterando diversos dispositivos que, dentre outras coisas, regulam o sistema de previdência dos militares. De acordo com a lei, há aumento de alíquota de contribuição, redução no rol de dependentes e dificuldades no reconhecimento dos cursos realizados, entre outros prejuízos.

“Como vocês sabem, nós na época que a proposta de reforma foi enviada, ainda no governo Bolsonaro, já alertávamos, junto com cabos, praças, familiares, as esposas presentes aqui conosco, do sistema de injustiças que estava sendo montado para a ampla maioria dos servidores das Forças Armadas”, afirmou Melchionna, que presidiu a reunião.

Cobrança direta ao Ministério da Defesa

Coautor do requerimento para a realização da audiência, o deputado Glauber Braga fez uma fala contundente direcionada diretamente ao representante do Ministério da Defesa, tenente-brigadeiro Heraldo Rodrigues, que participou remotamente do encontro. Ele fez um apelo enfático para que a pasta reveja não só a legislação vigente, que mantém o quadro de desigualdade e foi arbitrariamente imposta no governo passado, mas que apresente soluções práticas para que o problema não se arraste por mais tempo.

“Queremos respostas concretas e objetivas. Algumas questões relativas ao quadro especial não vão ser resolvidas pelas modificações da Lei 13.954, isso é mais um motivo para que a gente tenha uma resposta concreta sobre o grupo de trabalho com participação de pensionistas e de praças das FA. Já fizemos inúmeras vezes a pergunta sobre o que saiu desse grupo de trabalho, e não há respostas. Tem que ter a formação desse grupo de trabalho para que essas questões que estão sendo levantadas possam ser respondidas; enfrentamento jurídico é uma parte. Essa tensão não pode durar mais três anos e meio, com essas discrepâncias. Isso não atende ao fortalecimento do que é a representação de FA que tenha objetivo de garantir e trabalhar pela nossa soberania. Isso pode ser bom para alguns poucos, mas não é bom para as FA. Essa sensibilidade que a gente busca na cobrança que faz ao Ministério da Defesa”, declarou.

Ficou comprovado nas exposições, por exemplo, que nada justifica haver um percentual de ampliação dos rendimentos de fato para um general que seja de 41% e pra um soldado de 5%. Um dos quesitos debatidos, o de altos estudos e cursos realizados, colocados como critérios meritocráticos, mostrou claramente isso.

“Meritocracia” só beneficiou oficiais de alta patente

Durante a tramitação do PL 1645/19, que originou a lei 13.954, o então ministro da Defesa, Fernando Azevedo, falou que a restruturação era “meritocrática”, para valorizar os cursos e militares a partir daquela data. No entanto, depois foi publicada a Portaria 86/2020, que estabeleceu os cursos que dão direito ao adicional de habilitação aos militares das FA. No que diz respeito a oficiais, houve a possibilidade de que esses cursos viessem a ser incorporados na prática com aumento dos respectivos rendimentos. Isso, no entanto, não foi aplicado aos praças.

Entre as principais injustiças citadas em detalhe pelos participantes da audiência (veja lista abaixo), estão a bitributação, o aumento do tempo de contribuição, a mudança do tempo de serviço para adicional de disponibilidade (que ocasionou perdas) e a questão dos cursos (com acessibilidade injusta e acesso dificultado mesmo quando relativos à graduação).

“O governo de Jair Bolsonaro, um desastre sem precedentes desde a redemocratização, aprofundou desigualdades em basicamente todos os setores da sociedade. Nem mesmo entre os militares, público destinatário de diversas benesses durante os últimos quatro anos, o tratamento foi igualitário”, explica o deputado Glauber.

Enquanto as altas patentes das Forças Armadas foram agraciadas com cargos e diversos benefícios, o que levou o último governo a ser o que mais possuía militares em cargos civis, os militares de menor graduação e os temporários foram severamente prejudicados, fundamentalmente a partir da reforma do sistema de proteção promovida pelo governo Bolsonaro.

Tais consequências trouxeram diversos impactos negativos para a família militar, principalmente para veteranos, temporários e pensionistas. Ademais, esta legislação é discriminatória, pois atenta contra diversos Tratados Internacionais dos quais o Brasil é signatário, especialmente a Convenção Americana de Direitos Humanos.

Participaram da audiência pública: tenente-brigadeiro Heraldo Luiz Rodrigues (secretário de Pessoal, Saúde, Desporto e Projetos Sociais do Ministério da Defesa), Vanderley Carlos Gonçalves (representante dos Militares das Forças Armadas do Estado de São Paulo), Cláudio Lino (representante do Instituto Brasileiro de Análise de Legislações Militares), Jéssica Rocha (especialista em Práticas Jurídicas – Pensionistas) e George Brito (representante dos Militares Reformados).

Fotos: Pablo Valadares e Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados