Deputados do PSOL consideram anistias a partidos da PEC 9 inconstitucionais e apresentam voto em separado na Comissão de Constituição e Justiça
Membros titulares, Sâmia Bomfim (SP) e Tarcísio Motta (RJ) conseguiram adiar a votação por semanas para alertar imprensa e sociedade e assinam documento que explica como a emenda premia os atos ilegais. Votação deve ocorrer hoje
16 maio 2023, 12:14 Tempo de leitura: 3 minutos, 29 segundos“O descumprimento da lei compensa”. Para a bancada do PSOL na Câmara, que apresentou voto em separado contra a Proposta de Emenda à Constituição nº 9 (PEC 9) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), é essa a mensagem que aquele texto passa. Resumidamente, a proposição retira as sanções previstas aos partidos que não preencheram a cota mínima de recursos ou não destinaram valores mínimos para candidaturas de mulheres e pessoas negras nas eleições, além de abrir margem ao uso de financiamento empresarial para pagamento de dívidas com fornecedores assumidas até 2015.
Sob aparente neutralidade – “conceder anistia a partidos políticos” –, a proposta mina os avanços levados a efeito para inclusão de mulheres e pessoas negras na política e cria os piores incentivos às agremiações “porque sinaliza que o descumprimento da lei compensa, porque será concedida, a cada dois anos, anistia às greis violadoras das ações afirmativas”.
Afirma a bancada, em seu voto em separado: “Apesar das relevantes contribuições de nossos principais Tribunais (STF e TSE, detalhadas no documento) para a inclusão política de mulheres e pessoas negras, este Congresso Nacional _oportunisticamente_ e inspirado em interesses particulares e mesquinhos, apresenta a famigerada PEC nº 9, de 2023”.
Além disso, no aspecto estritamente legal, as anistias instituídas pela PEC nº 9, 2023, violam claramente o princípio da segurança jurídica, em sua dimensão de proteção da confiança, da expectativa legítima e da boa-fé objetiva. A base deste argumento é que os pronunciamentos judiciais dos principais tribunais do país que deram efetividade às ações afirmativas de inclusão de mulheres e pessoas negras na política geraram em seus destinatários legítimas expectativas que devem ser preservadas.
“A PEC 9 é um retrocesso para a democracia brasileira. Depois de avanços e conquistas para mulheres e negros conseguirem financiamento público de campanha, ela anistia os que não se comprometeram com isso, rasga compromissos éticos e de bom uso do dinheiro público, ao propor anistia geral a quem tem irregularidades nas prestações de contas. E, por fim, reinsere a possibilidade de financiamento empresarial às campanhas e partidos”, afirma a Sâmia.
Tarcísio e Sâmia conseguiram adiar a votação da PEC por duas semanas com o objetivo de mobilizar a sociedade civil e alertar a imprensa. “A PEC 9 é um absurdo tanto na sua forma quanto no seu conteúdo. São regras e normas que já haviam sido aprovadas pelo Congresso e agora esse mesmo Congresso quer perdoar e anistiar as dívidas dos próprios partidos. O que deveria ser um incentivo para que mulheres e negros fossem eleitos e, assim, aumentassem a sua representatividade, deixa de acontecer. Não podemos continuar a compactuar com a falta de representatividade no Congresso”, justifica Tarcísio.
Avanço muito lento nas políticas para mulheres e negros
Sob o aspecto quantitativo, há elevada desproporção entre a quantidade de congressistas mulheres e pessoas autodeclaradas negras e a parcela que esses importantes grupos ocupa na sociedade brasileira. Nas eleições de 2022, dos aproximadamente 1.650 cargos político-eletivos preenchidos em 2022, apenas 39 foram ocupados por mulheres pretas.
De um universo de 9.794 mulheres que concorreram para a Câmara dos Deputados, Senado, Assembleias Legislativas e governos estaduais, foram eleitas 302 mulheres – equivalente a 3,1%. No mesmo pleito, verificou-se a vitória de mais de 1.300 homens, o que perfaz aproximadamente 7% de um total de 19.072 candidatos (informações colhidas pela Comissão Gestora de Política de Gênero do Tribunal Superior Eleitoral).
Segundo dados da Inter-Parliamentary Union (IPU), o Brasil está na 131º colocação no ranking mensal das mulheres nos parlamentos nacionais1. Essas informações, pasmem, são de março de 2023. Estamos atrás de países como Quênia (23,3%), Paquistão (20,5%), Arábia Saudita (19,9%) e outros que possuem um histórico de reiterada e sistemática discriminação contra mulheres, por exemplo.
Leia na íntegra o voto em separado: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2269478&filename=VTS+1+CCJC+%3D%3E+PEC+9/2023
Fotos: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados e Vinicius Loures/Câmara dos Deputados