Audiência promovida por Boulos traz avanços para entregadores de apps. Com apoio da oposição, deputado irá apresentar projeto com reivindicações da categoria

Governo se compromete a criar nova mesa de negociação com o setor

24 abr 2025, 15:20 Tempo de leitura: 6 minutos, 50 segundos
Audiência promovida por Boulos traz avanços para entregadores de apps. Com apoio da oposição, deputado irá apresentar projeto com reivindicações da categoria

O deputado federal Guilherme Boulos (PSOL) promoveu na tarde desta quarta-feira (23), na Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara dos Deputados, uma audiência pública para discutir as reivindicações dos entregadores de aplicativos. Com apoio da oposição, o encontro terminou com três principais avanços.

1) Lideranças da categoria obtiveram o compromisso do governo Lula, sob a figura de Gilberto Carvalho, secretário-nacional de Economia Popular e Solidária do Ministério do Trabalho, de criar uma nova mesa de negociações com o comando da categoria para avançar nas negociações sobre as demandas dos trabalhadores.

3) a partir das propostas dos entregadores, Boulos irá apresentar um PL abordando as reinvindicações da categoria, como a criação de uma pagamento mínimo por entrega e a criação de dispositivos para transparência ao algoritmo das plataformas; o projeto será redigido com apoio do governo Lula, dos representantes dos entregadores e de parlamentares de todo o espectro político, incluindo nomes de direita, que participaram da audiência pública

3) o iFood se comprometeu a receber as lideranças das entidades que representam os entregadores – e que participaram do Breque dos Apps – para dialogar sobre as reivindicações da categoria levantadas na audiência pública; o mandato de Boulos irá cobrar a plataforma para que a reunião seja efetivamente realizada

A audiência
A audiência pública foi convocada após o Breque dos Apps, paralisação de entregadores de aplicativos que mobilizou milhares de trabalhadores em mais de 200 cidades no início deste mês. Nela, a categoria apresentou suas principais reivindicações: mínimo de R$ 10 por entregas de até 4km, R$ 2,50 por km adicional, máximo de 3km para entregas com bicicleta e valor integral para rotas agrupadas com várias entregas.

Ao longo da audiência, os líderes da paralisação deram vários exemplos da precarização enfrentada pela categoria, como falta de transparência no repasse das gorjetas dadas pelos clientes, redução dos valores do seguro para acidentes e desrespeito a acordos por parte das plataformas, além de retaliações aos trabalhadores que lutam por seus direitos.

“Quando a gente liga televisão chegando em casa e vê aqueles comerciais lindos do iFood vendendo para a sociedade que é uma das melhores empresas para trabalhar, a gente fica realmente revoltado”, disse Jr. Freitas, liderança do Breque dos Apps. “A gente vai falar muito no nome iFood aqui porque ele é o monopólio. Ele tem mais de 80% do mercado. Se ele aumentar o preço, todos aumentam. Se ele baixar, todos baixam. Loggi, Lalamove, Rappi, 99, Uber, todos estão envolvidos também”, disse Edgar da Silva, o “Gringo”, presidente da Associação dos Motofretistas de Aplicativos e Autônomos do Brasil (AMABR).

“A gente não tá entregando só comida e remédio, a gente tá entregando a nossa saúde, a gente tá entregando os nossos sonhos, o tempo com a nossa família – que a gente não tem”, afirmou Alessandro Calado, o “Sorriso”, presidente da Associação dos Motofretistas Autônomos e Entregadores do Distrito Federal e Entorno (AMAE-DF). “Nós não somos autônomos nem empreendedores: nós fomos é iludidos. A fome chegou na nossa barriga e nos venderam uma falsa ilusão que não existe, dizendo que éramos patrão”, completou Rodrigo Lopes, do Sindicato dos Trabalhadores, Empregados, e Autônomos de Moto e Bicicleta por Aplicativo do Estado de Pernambuco (Seambape). “A gente é trabalhador, a gente é digno, a gente é pai de família e precisa levar comida para casa”, disse Nicolas Santos, da Aliança Nacional dos Entregadores por Aplicativo. “Nosso lado são os direitos dos trabalhadores, que estão sendo violados pelo iFood”, afirmou o entregador Bruno França.

A entregadora Jéssica Magalhães, que atua em Belo Horizonte, apontou as dificuldades enfrentadas pelas mulheres. “Nós temos entregadoras que são mães, por exemplo, e que não conseguem buscar os filhos na escola porque não tem brecha no cumprimento do agendamento”, revelou. “A gente tá aqui buscando melhora pra nossa categoria”, disse a entregadora Fernanda Nere.

Convergência e apoio da oposição
A audiência pública teve convergência entre parlamentares de esquerda e direita em torno das reivindicações dos entregadores. “Nós aqui somos favoráveis aos motoristas e aos moto-entregadores. E o que nós queremos é que o que se faça para vocês seja justo”, disse o deputado Daniel Agrobom (PL-GO), coordenador da Frente Parlamentar em Defesa dos Motoristas de Aplicativos, que reúne 201 deputados. “Nós temos que somar forças, é aí que se iniciam os bons debates”, afirmou.

“Os senhores precisam, e é direito, da boa remuneração; pode ter certeza que esse tipo de assunto une o Parlamento brasileiro”, afirmou o deputado Eli Borges (PL-TO). “Pedir R$ 2,50 (por km adicional) é uma medida excelente, é uma medida modesta; contem comigo, é um pedido justo”, disse Borges. “O iFood que não conte com o deputado Eli Borges a não ser que mude a maneira de tratar os senhores (entregadores)”. O deputado Gilvan Máximo (Republicanos-DF) se comprometeu a apoiar a categoria. “Podem contar comigo”, disse.

“Se nós conseguirmos aqui unir a esquerda e a direita pela pauta dos entregadores, a gente aprova tudo aqui nessa Casa que for preciso. Aí não vai ser vontade do iFood, se ele quer ou não quer, a gente aprova aqui por lei”, disse Boulos. “Que a gente concorde com a pauta que os entregadores estão trazendo , eu vou dizer pra vocês que isso é um avanço significativo dessa audiência”, afirmou o deputado.

Mesa de negociação
No encontro, Gilberto Carvalho anunciou também a criação de uma nova mesa de negociação para atender a categoria. “É preciso, de fato, uma regulamentação da profissão de vocês e romper essa história de autonomia sem direitos. Se a gente continuar desunido, quem vai rir são aqueles que os exploram. O Ministério do Trabalho assume aqui o compromisso de voltar a convocar uma mesa de negociação com vocês, com o patronato e com a nossa presença. Se o patronato estiver junto, ótimo: chegaremos a um acordo com mais facilidade para fazer um projeto que passe nessa Casa. Se eles não quiserem, faremos o projeto da mesma forma com vocês”, disse.

Projeto de Lei
Ao final da audiência, Boulos prometeu redigir um Projeto de Lei com apoio de parlamentares da direita e centro, além da esquerda e do governo Lula, para somar forças e aumentar as chances de aprovação. “Eu vou pessoalmente procurar os deputados que vieram aqui, os líderes dos partidos que vieram aqui e pedir pra que sejam coautores (do PL), para que ninguém fique disputando vaidade com ninguém”, disse.

Confira a lista de participantes da audiência

  1. Presidente da Associação dos Motofretistas Autônomos e Entregadores do Distrito Federal e Entorno (AMAE DF) e Coordenador Nacional do Sem Direitos: Alessandro da Conceição Calado (Sorriso)
  2. Liderança dos Entregadores de Aplicativo de São Paulo: Elias Pereira Freitas da Silva Junior (Jr. Freitas)
  3. Presidente da Associação dos Motofretistas de Aplicativos e Autônomos do Brasil (AMABR): Edgar Francisco da Silva (Gringo)
  4. Membro da Aliança Nacional dos Entregadores por Aplicativo: Nicolas Souza Santos
  5. Presidente do Sindicato dos Trabalhadores, Empregados, e Autônomos de Moto e Bicicleta por Aplicativo do Estado de Pernambuco (Seambape): Rodrigo Lopes da Silva Correia
  6. Gilberto Carvalho, secretário-executivo de Economia Popular do Ministério do Trabalho e Emprego
  7. Jhonny Borges, representante do iFood (participação online)
  8. Deputado Eli Borges (PL-TO)
  9. Deputado Daniel Agrobom (PL-GO)
  10. Deputado Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ)
  11. Deputada Erika Kokay (PT-DF)
  12. Ricardo Patah, dirigente sindical da UGT
  13. Jéssica Magalhães, entregadora
  14. Fernanda Nere, entregadora
  15. Renato Assad, geógrafo da USP
  16. Edson “Índio” Carneiro, ativista
  17. Bruno França, entregador de bicicleta, membro do Movimento Trabalhadores Sem Direitos
  18. Jô Cavalcanti, vereadora do PSOL em Recife
  19. Amsterdan Souza, entregador
  20. Diego Araújo, entregador
  21. Deputado Gilvan Máximo (Republicanos-DF)
  22. Deputado Marcon (PT-RS)

Fotos: Bruna Menezes