O Brasil precisa fazer sua escolha socioambiental
Insistir no uso de combustíveis fósseis é incompatível com sustentabilidade. Por Ivan Valente
17 out 2023, 10:19 Tempo de leitura: 3 minutos, 18 segundosA possibilidade de exploração de petróleo na Foz do Amazonas é tema polêmico que vem suscitando divergências internas ao governo e à sociedade. Os favoráveis à exploração abordam o indeferimento da licença ambiental para operação, emitido pelo Ibama, como um impeditivo ao desenvolvimento local e do país. Já os contrários ao projeto entendem que são necessários estudos técnicos mais abrangentes para melhor conhecimento da região e que a Petrobras apresente plano de operação com maior consistência técnica. No centro da polêmica, há a urgência em diminuir a dependência dos combustíveis fósseis, a fim de frear o aquecimento global.
A mudança do clima é uma das preocupações prioritárias do presidente Lula, que vem defendendo em fóruns nacionais e internacionais a necessidade de assumirmos compromissos mais ousados para o enfrentamento dessa emergência, que causa tragédias e desastres imensuráveis. Recentemente, em discurso na Assembleia Geral da ONU, Lula enfatizou a necessidade de corrigir os rumos e implantar medidas que já foram acordadas entre os países membros com o objetivo de frear o aquecimento global, o qual se torna cada vez mais severo, especialmente para os habitantes do sul global.
A queima dos combustíveis fósseis é a maior responsável pela emissão de gases de efeito estufa na atmosfera, de acordo com cientistas do IPCC da ONU. Na COP 26, realizada em 2021, na Escócia, foi aprovado acordo que, pela primeira vez, fez referência ao impacto dos combustíveis fósseis como causa da crise climática. Em maio deste ano, ministros de todos os Estados membros da União Europeia aprovaram texto em que se comprometem, até 2050, a eliminar gradualmente o uso de combustíveis fósseis e transitar para uma economia de carbono neutro.
Neste ano, realizei audiência pública na Câmara dos Deputados para debater a exploração de petróleo na Foz do Amazonas de forma aprofundada, com representantes do governo, Petrobras, sindicatos petroleiros, pesquisadores e organizações socioambientalistas. Debatemos que a realização da Avaliação Ambiental de Área Sedimentar, instituída pela portaria interministerial MME-MMA nº 198/2012, é necessária para que o processo de pesquisa, prospecção e exploração de petróleo, caso ocorra, garanta segurança socioambiental, biológica, econômica, científica e jurídica para a região, a natureza e a sociedade como um todo.
A Foz do Amazonas tem especificidades que a distinguem de outras bacias onde a Petrobras tem experiência na exploração petrolífera. Um possível acidente em área tão sensível pode causar prejuízos incalculáveis para os povos indígenas, comunidades tradicionais, corais, manguezais e as atividades econômicas locais.
É inequívoco que o empreendimento gera uma série de impactos negativos, que se agravam com a possível ocorrência de acidente e vazamento de óleo. Mas esse não é o único problema em tela. O Brasil deve fazer uma escolha segura para o nosso futuro socioambiental. Continuar com a atividade petrolífera intensa e abrir novas fronteiras exploratórias de combustíveis fósseis não se mostram compatíveis com as ações necessárias para frear o aquecimento global e garantir a sustentabilidade do planeta.
Temos o compromisso com a segurança energética e com a construção de uma matriz limpa no país, e a Petrobras é uma empresa estratégica nessa construção.
Se quiser manter o protagonismo de potência ambiental e campeão em defesa do meio ambiente, usufruindo dessa política correta, o Brasil não pode emitir sinais contraditórios e precisa fazer a escolha certa sobre a exploração de petróleo numa área tão sensível e simbólica como a Foz do Amazonas.
Artigo publicado no jornal Folha de São Paulo, em 15 de outubro de 2023.
Foto: Câmara dos Deputados