Deputada Célia Xakriabá defende tese e se torna a primeira indígena doutora em Antropologia pela UFMG
Com a presença de cerca de 400 indígenas dos povos Maxakali, Pataxó, Pataxoop, Xukuru e Xakriabá, a parlamentar apresentou sua tese para banca formada Conceição Evaristo (foto), Jozileia Kaingang, Ana Gomes, Rubens Alves da Silva e Aderval Costa Filho
4 nov 2024, 18:42 Tempo de leitura: 2 minutos, 45 segundosEm um marco histórico para a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e para o movimento indígena no Brasil, a deputada federal Célia Xakriabá (PSOL/MG) defendeu sua tese de doutorado na quarta-feira (30.10), tornando-se a primeira mulher indígena a obter o título de doutora em Antropologia pela instituição. Célia, que pertence ao povo Xakriabá, de Minas Gerais, trouxe para sua pesquisa a potência dos saberes tradicionais e da ciência indígena, reafirmando seu compromisso com a defesa do território e a valorização da cultura ancestral de seu povo.
Com a presença de cerca de 400 indígenas dos povos Maxakali, Pataxó, Pataxoop, Xukuru e Xakriabá, Célia apresentou sua tese para banca formada Conceição Evaristo, Jozileia Kaingang, Ana Gomes, Rubens Alves da Silva e Aderval Costa Filho. A apresentação foi precedida pela apresentação do músico e compositor Sérgio Pererê e por rituais indígenas conduzidos pelo Pajé Deda, que entoou cânticos ancestrais.
Na tese Ancestraliterra – Sabedoria indígena na política e na universidade, Célia apresenta uma visão de território que transcende a geografia, onde “o corpo é território, e o território é corpo”. Sua pesquisa propõe uma integração entre os conhecimentos indígenas e acadêmicos, mostrando que o saber das mulheres-semente – como ela mesma define – é tão fundamental para a ciência quanto o conhecimento produzido dentro das universidades. Para ela, as primeiras mulheres cientistas foram as benzedeiras e parteiras, aquelas que curam e preservam saberes ancestrais com um “C maiúsculo”.
A deputada destaca suas origens no Cerrado, onde o pequi, “o ouro do Cerrado”, simboliza o respeito e o cuidado com a natureza, em contraste com a exploração predatória dos recursos naturais. Em sua trajetória, Célia aponta que “forma-se no território” antes mesmo de chegar à universidade, e que a luta por espaços de representação – como o doutorado e o Congresso Nacional – é uma extensão da luta pela demarcação de terras indígenas.
Para Célia, a caneta, tanto na academia quanto na política, é uma ferramenta poderosa: pode “escrever livros e leis, mas também arrancar direitos”. Em seu discurso, ela reconhece o medo que muitos indígenas têm da caneta, uma vez que, no Congresso, ela “também é arma de fogo que assina morte”. Com essa metáfora, Célia evidencia a violência que pode estar contida nas decisões políticas e a importância de ocupar espaços de poder para proteger direitos e promover justiça social.
A tese da parlamentar mineira, que explora a interseção entre os saberes indígenas e os caminhos da política, reforça a importância de ocupar esses espaços para garantir que sua história não seja isolada. Ela se coloca como exemplo e inspiração, defendendo que as universidades e os parlamentos precisam abrigar mais indígenas, mais mulheres e mais vozes que trazem a ancestralidade como força. “Eu sou a primeira, mas não serei a última”, declara, reafirmando o compromisso de sua luta por uma representação que continue a valorizar as raízes culturais e a justiça social para os povos originários.