Bilionários não deveriam existir. Por Sâmia Bomfim.
Réplica à coluna "Quantas Sâmias fazem um Elon Musk?", de Helio Beltrão.
6 maio 2022, 10:41 Tempo de leitura: 3 minutos, 1 segundoO brasileiro que vai ao supermercado percebe a vida cada dia mais cara. E ainda são muitos os que nem sequer podem ir às compras. De acordo com dados recentes, pelo menos 12 milhões de brasileiros estão desempregados. Outros 5 milhões estão em desalento; 19 milhões passam fome e metade do país vive em insegurança alimentar.
Diante de tanta pobreza, miséria, fome e desemprego, um dado chama a atenção: o número de bilionários no mundo e no Brasil. São 42 novos bilionários brasileiros na lista da Forbes do ano de 2021. Trata-se de poucas dezenas de pessoas que acumulam, sozinhas, fortunas em uma escala inimaginável. Essa concentração de renda se dá, de um lado, a partir da exploração de milhões de trabalhadores, e, de outro, das “facilidades” corruptas forjadas por governos e poderosos.
Recentemente, virou notícia a compra do Twitter por Elon Musk, por US$ 44 bilhões (mais de R$ 200 bilhões). Musk acumula uma fortuna de mais de US$ 260 bilhões (R$ 1,3 trilhão, na cotação atual). Sua família, sul-africana, enriqueceu durante o Apartheid, explorando jazidas de esmeralda. Face ao escândalo, afirmei em minhas redes sociais e reafirmo: bilionários não deveriam existir! Também não deveriam existir a fome, a miséria e a exploração humana, fenômenos correlatos à existência de bilionários.
No dia 3 de maio, na Folha, o presidente de um instituto neoliberal, Helio Beltrão, publicou um artigo, na tentativa de rebater meu posicionamento, intitulado: “Quantas Sâmias fazem um Elon Musk?”.
O texto baseia-se na típica e falsa defesa da meritocracia, recorrente entre os “liberais” brasileiros. Diga-se de passagem, em geral, são liberais preocupados com as liberdades de seus próprios negócios e lucros, mas não com a liberdade das pessoas. Além disso, esses liberais são os primeiros a procurarem o Estado e serem salvos por ele quando seus lucros estão em risco.
Para o autor, no capitalismo, os empresários enriquecem porque criam produtos eficientes. Logo se percebe que, para ele, não existem trabalhadores, a classe que de fato produz a riqueza e os produtos no mundo, a troco de baixíssimos salários.
Outro argumento roto é o de que, taxando grandes fortunas, a economia quebra. Assim, os liberais tentam nos convencer de que a existência dos bilionários favorece a maioria da população. Mas o que ocorre é justamente o contrário.
Como líder do PSOL na Câmara dos Deputados, luto pela aprovação do PLP 277/08, que prevê a taxação de fortunas no Brasil. A medida, que é simples e prevista em nossa Constituição, reverteria o cenário atual, em que só os pobres e a classe média pagam imposto para valer. Consequentemente, teríamos mais recursos para a educação e a saúde, para o combate à desigualdade e para a efetivação de direitos. Teríamos mais justiça, assim como outros países no mundo já fizeram.
É claro que Beltrão, em seu artigo, ainda atacou os “políticos”, tentando me atingir. Mas, ao contrário de muitos deputados que se declaram liberais e defendem os bilionários, votei contra o fundo eleitoral extravagante articulado por Bolsonaro e o Centrão.
Corruptos e bilionários andam, geralmente, de mãos dadas. E, para mim, nem os primeiros nem os segundos são objetos de estimação.
Artigo publicado originalmente no jornal Folha de São Paulo , em 5 de maio de 2022.