Aylan, o sírio, nossa criança. Por Chico Alencar
Viemos da água, sementeira da vida.
Mas foi ali que o menino Aylan encontrou seu absurdo fim.
Na praia onde, como toda criança, devia gritar de alegria,
Aylan é dor, silêncio de pavor e brado de indignação.
O mar que o afogou mareja nos olhos atônitos
de quem não se desumanizou:
queríamos tanto que ele estivesse só dormindo...
Falamos de amar, de amor familiar
mas Galip, irmão de Aylan, e Riahn, a mãe deles
tiveram no mar seu esquife.
O líquido amniótico com que Riahn constituiu seus bebês
degradou-se na água escura que os tragou, para sempre.
Não, não foi um 'acidente'!
Essas mortes – 2.600 este ano, centenas de Aylans e Galips –
são produzidas pelas forças da violência letal,
pela estupidez dos dominadores,
pela máquina de exclusão, xenofobia e extermínio
com que todos os Estados, islâmicos e ocidentais, produzem a terrível sentença.
As fotos do antiNatal cutucam a globalização da indiferença.
Elas 'viralizaram' com a hashtag em turco
#KiyiyaVuranInsanlik.
Leio duas versões:
"a humanidade levada pelas ondas";
"a humanidade é um fracasso".
Sou tentado a acreditar em ambas.
Mas quero teimar, com muitos outros, em lutar para desmenti-las!
Ao menos enquanto a onda da descrença não nos leva,
enquanto não admitimos nosso fracasso como espécie.
Por Chico Alencar.